Domingo do Diabo

Samuel adorava a praia. Tanto que já recusou propostas de trabalho em São Paulo pelo simples fato de não poder jogar seu vôlei na areia dos domingos de manhã. Adorava nadar. Só não ia se estivesse chovendo, sempre tomou muito cuidado. Sempre soube que mar e chuva não eram uma boa combinação.
Rita não gostava tanto de mar. Claro que ela gostava de beber uma água de coco para refrescar diante daquele visual exuberante. Mas depois de 7 anos de casados, ela já não acompanhava Samuel com tanta frequência nas idas ao Arpoador. Muitas vezes, quando ela acordava, o café já estava passado e o lado da cama, vazio.
E foi num domingo de manhã bem cedo, quando o sol ainda nem tinha saído, que ele seguiu à Pedra do Diabo. Quando o sol já se punha, ele não retornava a casa. Samuel nunca levava o celular se ela não o acompanhasse. Dizia que não tinha quem tomasse conta. Rita olhava o celular sobre o balcão e o coração apertava. Por que a demora? Olhando o celular do marido, viu que tinha um bilhete embaixo – AMO VOCÊ – escrito em letra de forma. Foi então que ela resolveu procurá-lo. Em vão.
Passaram-se dias, quando o tenente Fábio, amigo do casal, ligou numa manhã chuvosa. Encontraram Samuel. Encontraram o corpo de Samuel. Segundo o amigo, pela fratura no crânio, ele pode ter escorregado da pedra antes de mergulhar. Ou até ter se chocado enquanto nadava…
Por dias, Rita não assimilou isso. No velório, ela estava em choque. O que ele mais gostava de fazer tirou sua vida. O mar carregou seu amor e junto, seu coração.
Passaram-se semanas e Rita não voltou ao trabalho. Meses depois, não tinha mais notícias dela.
Já se foram dois anos e domingo passado resolvi ir à praia. Ao Arpoador, para variar. Na mesma Pedra do Diabo encontrei Rita. Sozinha, visivelmente envelhecida. Sentei ao seu lado, ela não me reconheceu. Com os olhos vermelhos, escrevia num papel, que consegui ler antes dela lançá-lo ao mar.

Enquanto meus pés não tocam o chão, eu vôo por entre nuvens densas. Vou me guiando pela distância que mantenho de você. Foi bom ter você em meus braços. Sua ausência continua escrevendo a minha história. Pois se contratempos nos afastaram, a saudade ainda nos mantém unidos… eternamente.

Então, ela levantou, foi embora e não olhou pra trás.
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Há uns dias, recebi um selo interessante da Amanda. Claro que fiquei feliz, mas ainda não vi como esse blog é capaz de mudar o mundo… Mas vai entender a cabeça das pessoas? Repasso a todos aqueles que mudam o meu mundo, diariamente.

14 pensamentos sobre “Domingo do Diabo

  1. veio, por um momento achei que você tava contando uma coisa q aconteceu com você, mas era só mais uma daquelas pessoas que gostam de falar na terceira pessoa!IAEUaheuHAEUHaueAHEUAheuhAUEHUAheuhABACANA…–www.moolegal.wordpress.como blog é de humor e ‘nois’ fala na pessoa que a gente quiser!

  2. Pois é… O amor é capaz de colocar a gente em outra dimensão.Olhares menos sensíveis acharão que Rita quer destruir sua vida, envelhecendo a passos largos, por desalento pela perda.Talvez numa pseudo-loucura, Rita busca nova vida, ou o reencontro da vida que teve repleta de amor.Escrever isso, para mim, pode ser fácil. Ser o amigo de Rita que a encontra e ela não o reconhece, talvez seja uma experiência cruel, e inaceitável.O corpo de Samuel não vive mais. É fato.Mas o amor de Samuel é forte o suficiente para manter em Rita a esperança de continuar vivendo (d)esse amor. Na loucura de Rita, ou no coração, como bem quiserem interpretar isso, Samuel está lá, amparando-as nos braços como ela um dia fez. E explica no bilhete que é assim que vive. Carregando nos braços da alma o amor de Samuel.Louca? Não, apenas uma mulher apaixonada.E ninguém, em sua lucidez (lucidez?) será capaz de compreender isso.A menos que viva um amor igual.

  3. Dizem que a maior dor depois de se perder um filho é a de perder um grande amor.Fiquei até arrepiada… é uma história de amor eterno.Beijos!

  4. Eu pensava que tu tava contando uma história que aconteceu contigo. Legal, gostei.Quanto ao selo, certa vez eu pensei em fazer um meme, cujo os blogueiros tinham que dar uma ideia, na verdade um projeto de reforma, seja ela em qualquer aspecto, para mudar a forma de pensamento do mundo. Na época (como se fosse a muitos anos atrás) eu mostrei a um ou dois blogueiros, e na verdade nos tr~es achamos muito “nerd” esse meme, resultado, não saiu do papel, nem pro papel foi pra falar a verdade.Então que esse selo dê esperanças, que realmente esses tias blogs que o recebem mudem o mundo, de alguma forma e que essa forma seja significativa.Belo post, belo blog.

  5. Engraçado… não que eu seja insensível as dores da Rita… mas me peguei pensando mais no Samuel. Que irônica morte. Fiquei pensando que todo mundo sonha em morrer fazendo o que se gosta… mas talvez essa seja a morte mais cruel e inesperada… enfim…

  6. Me lembrei da música do Caymmi: “É doce morrer no mar…” rsrs A dor da perda pode mesmo ser insuportável, muitas vezes levando um pedaço muito grande da gente. Me senti um pouco Rita lendo isso.

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